O tempo se encarrega de assentar as cinzas, despetalar as flores e renovar os campos, ele se encarrega de secar as lágrimas, trazer o riso e purificar os oceanos, o tempo se encarrega de si mesmo e de outrem, se encarrega da morte e da vida, da seca e da chuva, dos laços e dos desatos, mas não se encarrega do coração e a quem, ou o quê, quer manter-se ligado, conectado, como um fio de aço, mas se quebra tão facilmente quando não há mais pecado. Muitas vezes as fuligens que o tempo deixa para trás é guardada em relicário, ele não entende porquê deve passar se o peito se encontra no passado, remoendo histórias, presos em lembranças e memórias, o tempo se encarrega de partir, mas não se encarrega do que pode porvir, o tempo traz a colheita, mas quem escolhe a semente é quem fará a ceifa.
O tempo não se cansa, pois vive no infinito, quem o sente é a criança que logo envelhece e perde a esperança, algo tão bonito, transformou-se em matemática, dividiu-se em vinte e quatro e se desdobra para viver das fuligens, nunca cessa, porque nunca deixa de morrer, os campos brotam e desabrocham, é um ciclo, não há o que fazer, e o tempo se pergunta para quê? Para onde levarão as cinzas, os abraços, as ruínas e os laços? Tudo murchará, pois há de murchar, esse é o seu papel, dar-lhe-á vida, mas também há de tirar, mas como disse, quem escolhe o que mantém perto são as almas que não se perdem no tempo, e se a vida for seus olhos, então vivo será em qualquer hora ou momento, entretanto não há respostas para quem escolhe os ponteiros, pois ele corre com o tempo, mas logo solta seu companheiro. Pobre alma, que viveu com suas migalhas, valsou com a ampulheta, escolheu as dores falhas, e escorreu em sua areia, se perdeu de si, do tempo e da vida, e voltara para o infinito, sem volta e sem saída, o tempo se despediu e não deixou nenhuma carta, apenas o vazio de se encontrar sem a graça.
Por Luiza Campos